Enxaqueca: O Guia Completo (2025)

O Guia Completo para Compreender, Diagnosticar e Tratar

Em Portugal, aproximadamente 1,5 milhões de pessoas sofrem de enxaqueca – 1 em cada 5 mulheres e 1 em cada 10 homens. 79% dos doentes portugueses sentem-se limitados nas tarefas diárias devido à condição. Mas será a enxaqueca apenas uma “dor de cabeça forte”?

É saber, 20 minutos antes de chegar, que vem aí. Pequenas luzes cintilantes que começam no canto dos olhos, como se alguém tivesse acendido um flash bem à frente do rosto. Depois vem a náusea, aquela sensação de estômago às voltas que faz com que até o cheiro do café da manhã se torne insuportável. E finalmente a dor – não uma simples “dor de cabeça”, mas uma sensação latejante, pulsante, como se o coração tivesse mudado de lugar e estivesse a bater dentro da cabeça.

A luz do dia queima os olhos, o som da televisão é como um martelo, e mexer-se piora tudo. É cancelar planos pela terceira vez este mês, é ouvir “mas tens tão bom aspeto” quando mal consegue manter os olhos abertos, é a frustração de explicar que não, não é “só uma dor de cabeça que passa com uma aspirina”.

Para quem vive com enxaqueca, não é falta de resistência, ou “psicológico”. É uma doença neurológica real que transforma completamente a forma como se vive e se planeia cada dia, sempre com o receio de quando virá a próxima crise.

O que é a Enxaqueca?

A enxaqueca é um tipo de cefaleia (dor de cabeça) primária, caracterizada por episódios recorrentes de cefaleia intensa, frequentemente acompanhada de náuseas, vómitos e hipersensibilidade à luz e ao som. É muito mais que uma simples dor de cabeça – é uma condição complexa com base genética e neurobiológica que afeta profundamente a qualidade de vida.

A enxaqueca resulta de uma combinação de processos cerebrais: excitação e depressão de células nervosas, alterações vasculares e libertação de substâncias químicas que sensibilizam as vias da dor. As pessoas com enxaqueca têm um sistema nervoso excepcionalmente sensível a certos estímulos, ambientais ou do próprio organismo.

Diferença entre Cefaleia e Enxaqueca

Cefaleia é um termo geral que descreve qualquer dor de cabeça. Existem mais de 200 tipos diferentes de cefaleias, divididas em dois grandes grupos: primárias (que são uma condição em si) e secundárias (sintomas que resultam de outros problemas de saúde).

A enxaqueca é uma cefaleia primária – uma das mais frequentes e bem caracterizadas. Ao contrário de uma dor de cabeça comum, a enxaqueca apresenta características muito específicas e um impacto significativo no funcionamento diário.

CaracterísticaDor de Cabeça ComumEnxaqueca
IntensidadeLigeira a moderadaModerada a grave, incapacitante
LocalizaçãoDifusa ou bilateralFrequentemente unilateral
Tipo de dorPressão, pesoPulsátil, latejante
DuraçãoAlgumas horas4 a 72 horas
AgravamentoNão afeta atividadePiora com atividade física
Sintomas associadosRarosNáuseas, fotofobia, fonofobia
Impacto funcionalMínimoInterfere com tarefas diárias

Reconhecimento em Portugal

Em Portugal, a enxaqueca é reconhecida como uma condição neurológica crónica que afeta aproximadamente 1,5 milhões de pessoas. Infelizmente, a condição permanece subdiagnosticada e subtratada.

Dados preocupantes revelam que:

  • 40% dos doentes não têm qualquer acompanhamento médico regular
  • 60% dos doentes em tratamento expressam insatisfação
  • 55-70% desconhecem opções de tratamento inovadoras
  • 70% dos que têm acompanhamento recorreram ao setor privado

A enxaqueca representa uma das principais causas de absentismo laboral, com uma média de 3-4 dias de faltas por ano por doente. Segundo a Organização Mundial de Saúde, é a principal causa de incapacidade em pessoas com menos de 50 anos.

Nota Importante: A enxaqueca nunca é “normal” ou “apenas uma dor de cabeça”. É uma doença neurológica legítima que carece de diagnóstico correto e tratamento especializado.

Tipos de Enxaqueca

A enxaqueca manifesta-se de formas diversas, e compreender estas variações é fundamental para o diagnóstico e tratamento adequados.

Enxaqueca sem Aura

Este tipo representa 70-80% de todos os casos de enxaqueca. Caracteriza-se por:

  • Dor de cabeça intensa sem sintomas neurológicos prévios
  • Início gradual ou súbito da cefaleia
  • Todos os sintomas típicos (náuseas, fotofobia, fonofobia…)
  • Duração de 4 a 72 horas

Este é o tipo mais comum, e muitas pessoas vivem anos com estes sintomas sem saber que têm enxaqueca.

Enxaqueca com Aura

Afeta 20-30% das pessoas com enxaqueca. A aura consiste em sintomas neurológicos temporários e reversíveis que geralmente precedem a cefaleia em 10 a 60 minutos.

Aura Visual (mais comum – 90% das auras):

  • Pontos brilhantes ou cintilantes
  • Linhas em ziguezague luminosas
  • Manchas escuras no campo visual
  • Turvação temporária da visão
  • Espectro de fortificação (padrões geométricos brilhantes)

Aura Sensitiva:

  • Formigueiro ou dormência
  • Começa habitualmente numa mão
  • Pode estender-se ao braço e face do mesmo lado
  • Sensação de “alfinetes e agulhas”

Aura da Fala/Linguagem:

  • Dificuldade em encontrar palavras
  • Fala arrastada temporária
  • Incapacidade temporária de compreender linguagem

Aura Motora:

  • Fraqueza temporária num lado do corpo
  • Dificuldade em coordenar movimentos
  • Rara, mas quando presente requer avaliação cuidadosa

É importante notar que a mesma pessoa pode ter crises com aura e sem aura em momentos diferentes.

Enxaqueca Crónica

Diagnosticada quando há cefaleia em 15 ou mais dias por mês, durante pelo menos três meses, sendo que em pelo menos 8 desses dias a cefaleia tem características de enxaqueca.

Afeta cerca de 2% da população mundial e está frequentemente associada a:

  • Uso excessivo de medicação analgésica
  • Stress crónico
  • Perturbações do sono
  • Depressão ou ansiedade
  • Outros problemas de saúde

Tipos Raros de Enxaqueca

Enxaqueca Hemiplégica:

  • Causa fraqueza temporária num lado do corpo
  • Pode ser esporádica ou familiar (genética)

Enxaqueca com Aura do Tronco Cerebral:

  • Vertigem intensa
  • Dificuldade em falar
  • Zumbidos nos ouvidos
  • Perda de equilíbrio
  • Alterações temporárias ao nível da consciência

Enxaqueca Retiniana:

  • Perda visual temporária num olho
  • Rara e requer exclusão de outras causas graves

Sintomas mais comuns da Enxaqueca

A enxaqueca é uma experiência complexa que se pode estender em 4 fases distintas.

As Quatro Fases da Enxaqueca

Fase 1: Sintomas Premonitórios (Pródromo)

Ocorre horas ou até 1-2 dias antes da cefaleia. Muitas pessoas aprendem a reconhecer estes sinais:

  • Mudanças de humor (irritabilidade, euforia)
  • Dificuldade de concentração
  • Fadiga e sonolência
  • Rigidez no pescoço
  • Desejos alimentares específicos
  • Sede
  • Sensibilidade à luz aumentada

Fase 2: Aura (quando presente)

Dura tipicamente 5 a 60 minutos. Inclui sintomas neurológicos temporários, sendo os visuais os mais comuns. Alguns dos sintomas mais comuns são:

  • Alterações na visão
  • Formigueiros e dormência
  • Dificuldades de linguagem
A maioria dos doentes tem enxaqueca sem aura. Apenas 15%-30% dos doentes experienciam aura.

Fase 3: Cefaleia (Fase de Dor)

Esta é a fase mais debilitante:

Características da Dor:

  • Intensidade moderada a grave
  • Natureza pulsátil ou latejante
  • Geralmente unilateral (pode ser bilateral)
  • Piora com a atividade física
  • Duração de 4 a 72 horas

Sintomas Associados:

  • Náuseas (80% dos casos)
  • Vómitos (frequentes)
  • Fotofobia (sensibilidade à luz) – obriga a ambientes escuros
  • Fonofobia (sensibilidade ao som) – ruídos normais tornam-se insuportáveis
  • Osmofobia (sensibilidade a odores)
  • Tonturas
  • Visão turva

Durante esta fase, a maioria das pessoas precisa de parar completamente as suas atividades e isolar-se num quarto escuro e silencioso.

Fase 4: Fase de recuperação (Pósdromo)

Após a resolução da dor, muitos doentes experienciam:

  • Fadiga profunda
  • Dificuldade de concentração
  • Confusão mental ligeira
  • Alterações de humor
  • Fraqueza
  • Sensibilidade residual

Esta fase pode durar 24-48 horas, durante as quais a pessoa ainda não está completamente funcional.

Nota Importante: Nem todas as pessoas experimentam todas as fases ou todos os sintomas. A enxaqueca é altamente individual, e os padrões podem variar até na mesma pessoa ao longo do tempo.

Causas e fatores de risco

A enxaqueca resulta de uma interação complexa entre predisposição genética e fatores ambientais. Não existe uma causa única, mas múltiplos mecanismos que contribuem para o seu desenvolvimento.

Fatores Genéticos

A enxaqueca tem uma forte componente hereditária:

  • 70% das pessoas com enxaqueca têm um familiar próximo com a condição
  • Se ambos os pais têm enxaqueca, o risco para os filhos é de aproximadamente 70%
  • Se apenas um progenitor tem enxaqueca, o risco reduz para 45%

Investigadores já identificaram múltiplas variantes genéticas associadas à enxaqueca, confirmando que é uma condição com base biológica real.

Mecanismos Neurobiológicos

Hiperexcitabilidade Cortical: O cérebro das pessoas com enxaqueca é anormalmente hipersensível. As células nervosas são facilmente estimuladas, produzindo atividade elétrica excessiva.

Depressão Alastrante Cortical: Durante uma crise de enxaqueca, ocorre uma onda de atividade elétrica anormal que se propaga pelo córtex cerebral, seguida de uma supressão da atividade (desligamento). É este fenómeno que está na origem da aura.

Sistema Trigeminovascular: O nervo trigémeo (5º nervo craniano) desempenha um papel central. O nervo trigémeo é o principal nervo responsável pela sensibilidade da face e parte da cabeça — permite sentir dor, calor, frio e toque. Quando estimulado, liberta substâncias que causam inflamação dolorosa dos vasos sanguíneos cerebrais e das meninges (camadas protetoras entre o cérebro e o crânio).

Neurotransmissores associados à dor:

  • Serotonina: Hormona reguladora do humor. Níveis anormais estão associados ao desencadeamento de crises
  • CGRP: molécula que quando libertada durante crises, causa dilatação vascular e dor

Fatores Desencadeantes (Triggers)

É fundamental compreender que nenhum fator desencadeante é comum a todos os doentes, e raramente um determinado fator provoca sempre uma crise no mesmo indivíduo. Frequentemente, é a combinação de vários fatores que desencadeia uma crise.

Fatores Hormonais (especialmente em mulheres):

  • Menstruação (enxaqueca menstrual)
  • Ovulação
  • Pílula contracetiva
  • Terapêutica hormonal de substituição
  • Gravidez (pode melhorar ou piorar)
  • Menopausa

Fatores Alimentares:

Há alguns alimentos e padrões alimentares correlacionados à enxaqueca, relatados muitas vezes como desencadeadores de crises no consultório:
  • Chocolate
  • Queijos envelhecidos
  • Vinho tinto e outras bebidas alcoólicas
  • Alimentos processados com conservantes
  • Cafeína (excesso ou privação súbita)
  • Adoçantes artificiais
  • Glutamato monossódico
  • Jejum prolongado ou saltar refeições

Fatores Ambientais:

  • Luzes intensas ou cintilantes
  • Ruídos fortes
  • Odores intensos (perfumes, fumo)
  • Mudanças climáticas (especialmente pressão atmosférica)
  • Mudanças de altitude
  • Calor ou humidade excessivos

Fatores de Estilo de Vida:

  • Stress prolongado
  • Privação de sono ou excesso de sono
  • Alterações na rotina de sono
  • Exercício físico intenso súbito
  • Viagens e jet lag

Outros Fatores:

  • Estimulação sensorial excessiva
  • Certos medicamentos
  • Desidratação

Prevalência por Género e Idade

Diferenças de Género:

  • Antes da puberdade, a prevalência é igual entre rapazes e raparigas
  • Após a puberdade, as mulheres têm risco 2-3 vezes superior aos homens
  • Pico de prevalência nas mulheres: 30-39 anos
  • Influência hormonal: os estrogénios desempenham papel importante (diminuição dos níveis desencadeia frequentemente crises de enxaqueca – queda antes da menstruação)

Evolução ao Longo da Vida:

  • Início típico: entre 15 e 40 anos
  • Pode aparecer na infância ou após primeira menstruação
  • Surge raramente pela primeira vez após os 50 anos (requer exclusão de outras causas)
  • Tende a melhorar ou desaparecer durante a gravidez em muitas mulheres (aumento dos níveis de estrogénio)
  • Frequentemente atenua ou desaparece após a menopausa

O Diagnóstico da Enxaqueca

O diagnóstico da enxaqueca é fundamentalmente clínico, baseado na história detalhada dos sintomas e no exame neurológico. Não existe um exame específico que “confirme” enxaqueca, mas a avaliação cuidadosa permite um diagnóstico preciso na grande maioria dos casos.

Critérios Diagnósticos Atualizados

A International Headache Society estabeleceu critérios diagnósticos precisos na Classificação Internacional de Cefaleias (ICHD-3). Para enxaqueca sem aura, devem estar presentes:

Critério A: Pelo menos 5 crises que preencham os seguintes critérios B e D

Critério B: Duração da cefaleia entre 4 e 72 horas (sem tratamento ou com tratamento inadequado)

Critério C: A cefaleia tem pelo menos duas das seguintes características:

  • Localização unilateral
  • Qualidade pulsátil
  • Intensidade moderada a grave
  • Agravamento por atividade física rotineira

Critério D: Durante a cefaleia, pelo menos um dos seguintes:

  • Náuseas ou vómitos
  • Fotofobia e fonofobia

Critério E: Não melhor explicada por outro diagnóstico

Para enxaqueca com aura, existem critérios adicionais que incluem características específicas dos sintomas neurológicos temporários.

Classificação CID-11: G43 (Enxaqueca)

  • G43.0: Enxaqueca sem aura
  • G43.1: Enxaqueca com aura
  • G43.2: Estado de mal enxaquecoso
  • G43.3: Enxaqueca crónica

Processo Diagnóstico

Anamnese Detalhada:

O médico irá explorar:

  • Características da dor (localização, tipo, intensidade, duração)
  • Sintomas associados
  • Frequência das crises
  • Fatores desencadeantes identificados
  • Histórico familiar
  • Impacto na qualidade de vida
  • Tratamentos já tentados e resposta aos mesmos

Diário de Crises:

Manter um diário durante pelo menos 1 a 2 meses é extremamente útil, uma vez que o diagnóstico muitas vezes não é imediato. Deve registar:

  • Data e hora de início
  • Duração da crise
  • Intensidade (escala 0-10)
  • Sintomas específicos
  • Possíveis desencadeadores/triggers
  • Medicação tomada e resposta

Exame Neurológico:

Um exame neurológico completo pode ser muito útil no despiste de outras condições.

Quando São Necessários Exames Complementares:

Na maioria dos casos, pacientes com sintomas típicos e exame neurológico normal não necessitam de exames adicionais. Contudo, exames como ressonância magnética ou tomografia computadorizada podem ser indicados quando há sinais de alerta (sintomas atípicos):

  • Primeira enxaqueca após os 50 anos
  • Mudança súbita no padrão das cefaleias
  • Cefaleia “em trovoada” (pico de intensidade em segundos)
  • Sintomas neurológicos adicionais aos típicos da aura
  • Febre, rigidez da nuca ou alteração do estado mental
  • Convulsões
  • Histórico de cancro ou imunossupressão (condições do sistema imunitário)
Nota Importante: O diagnóstico de enxaqueca deve ser sempre feito por um médico neurologista, idealmente especializado em cefaleias. Evite a todo o custo o autodiagnóstico, que pode levar a tratamentos inadequados ou atraso no diagnóstico e tratamento de outras condições.

Diagnóstico Diferencial

É importante excluir outras causas de cefaleia, incluindo:

Enxaqueca em Crianças e Adolescentes

A enxaqueca pode manifestar-se de forma diferente nas crianças:

  • Crises frequentemente bilaterais (nos dois lados)
  • Duração mais curta (pode ser inferior a 4 horas)
  • Vómitos mais exuberantes
  • Localização frontal (testa) ou periorbital (ao redor dos olhos) mais comum
  • Pode manifestar-se como vómitos cíclicos ou vertigem recorrente

A identificação precoce é fundamental para tratamento adequado e prevenção do impacto no desenvolvimento e rendimento escolar.

Impacto da Enxaqueca na vida diária

A enxaqueca é muito mais que uma condição médica – é uma força que transforma profundamente todas as dimensões da vida.

Impacto Pessoal

Os números revelam a gravidade do problema:

  • 79% dos doentes portugueses sentem-se limitados na realização das tarefas diárias
  • 81% referem que a enxaqueca afeta as suas vidas sociais
  • 39% afirmam que impossibilita até mesmo a realização de hobbies e atividades de lazer

Durante uma crise, atividades simples como tomar banho, preparar refeições ou cuidar dos filhos tornam-se praticamente impossíveis. A necessidade de isolamento num quarto escuro e silencioso pode durar horas ou dias.

Impacto Profissional

A enxaqueca é uma das principais causas de absentismo laboral em Portugal:

  • Média de 3-4 dias de ausência ao trabalho por ano por doente
  • 50% dos doentes ficam ausentes do trabalho durante crises
  • Perda significativa de produtividade mesmo quando presentes
  • Impacto nas oportunidades de progressão na carreira
  • Custo económico significativo para o país

Muitos doentes relatam dificuldades em:

  • Cumprir prazos durante ou após crises
  • Participar em reuniões importantes
  • Aceitar projetos com responsabilidades exigentes
  • Viajar em trabalho

Impacto Emocional e Psicológico

Ansiedade Antecipatória: O medo constante de quando virá a próxima crise cria um estado de alerta permanente. Planear eventos importantes, férias ou compromissos sociais torna-se fonte de ansiedade.

Depressão Associada: A natureza imprevisível e incapacitante da enxaqueca contribui para sintomas depressivos. A relação é bidirecional – a depressão também pode piorar as enxaquecas.

Isolamento Social:

  • Cancelamento frequente de planos leva ao afastamento gradual de amigos
  • Receio de aceitar convites
  • Sentimentos de culpa por “decepcionar” outros
  • Dificuldade em explicar uma condição “invisível”

Estigma: Um dos aspetos mais dolorosos é ouvir:

  • “É só uma dor de cabeça”
  • “Toma uma aspirina que isso passa”
  • “Estás sempre com dores de cabeça” (tom de desconfiança)
  • “Mas tens tão bom aspeto”

Este estigma leva muitos doentes a minimizar os sintomas ou a evitar procurar ajuda.

Impacto Familiar

A enxaqueca tende a afetar toda a família:

  • Cônjuges assumem responsabilidades adicionais
  • Filhos podem não compreender porque o pai/mãe “não pode brincar”
  • Planos familiares frequentemente cancelados
  • Stress adicional nas relações
  • Cuidadores tendem a sofrer de burnout emocional

Impacto Económico

Custos Diretos:

  • Consultas médicas
  • Medicação aguda e preventiva
  • Exames complementares
  • Tratamentos especializados

Custos Indiretos:

  • Perda de rendimento por absentismo
  • Redução de produtividade
  • Reforma antecipada em casos graves
  • Impacto na progressão profissional

Estima-se que o impacto económico da enxaqueca seja extremamente significativo para a economia nacional, embora os valores exatos sejam difíceis de quantificar por diversos motivos, incluindo a grande quantidade de casos que não são diagnosticados nem tratados.

Reconhecimento pela OMS: A Organização Mundial de Saúde reconhece a enxaqueca como a “segunda maior causa de anos vividos com incapacidade”, e a “principal causa de incapacidade por doença neurológica” globalmente.

Como se trata a Enxaqueca?

Embora a enxaqueca não tenha cura definitiva, existe uma ampla gama de tratamentos eficazes que podem transformar significativamente a qualidade de vida. O tratamento é sempre personalizado, baseado na frequência e gravidade das crises, no impacto funcional e nas características individuais de cada paciente.

Abordagem Multidisciplinar

O tratamento ideal combina várias estratégias:

  • Tratamento agudo (para alívio das crises, da dor)
  • Tratamento preventivo (para reduzir frequência e intensidade)
  • Identificação e eliminação de triggers
  • Modificações no estilo de vida
  • Apoio psicológico quando necessário

Tratamento Farmacológico

Tratamento Agudo (Durante as Crises):

O objetivo é aliviar rapidamente os sintomas. A eficácia é maior quando o medicamento é tomado logo no início da crise.

Analgésicos Simples (Ibuprofeno):

  • Eficaz em crises ligeiras
  • Bem tolerado

Anti-Inflamatórios Não Esteroides (AINEs):

  • Ibuprofeno, naproxeno, diclofenac
  • Eficazes em crises ligeiras a moderadas
  • Podem causar problemas gástricos com uso frequente

Triptanos – medicamentos desenvolvidos especificamente para enxaqueca:

  • Sumatriptano (disponível em comprimidos, spray nasal, injeção)
  • Rizatriptano
  • Eletriptano
  • Zolmitriptano

Atuam nos recetores de serotonina, interrompendo o processo da enxaqueca. São muito eficazes quando tomados precocemente, mas têm contraindicações importantes (doença cardiovascular, hipertensão não controlada…).

Gepantes (Fármacos de Nova Geração):

  • Rimegepant, ubrogepant
  • Bloqueiam o recetor de CGRP
  • Alternativa aos triptanos
  • Podem ser usados em doentes com contraindicações cardiovasculares

Antieméticos:

  • Metoclopramida, domperidona
  • Controlam náuseas e vómitos
  • Podem potenciar o efeito dos analgésicos
Nota Importante: O uso excessivo de medicação analgésica (mais de 10-15 dias por mês) pode levar à cefaleia por uso excessivo de medicação, agravando o problema. Este é um dos motivos pelos quais o tratamento preventivo é fundamental em muitos casos.

Tratamento Preventivo:

Indicado quando:

  • Crises frequentes (4 ou mais por mês)
  • Crises muito prolongadas ou graves
  • Resposta inadequada ao tratamento agudo
  • Contraindicações aos tratamentos agudos
  • Impacto significativo na qualidade de vida

Betabloqueadores:

  • Propranolol, metoprolol
  • Reduzem frequência das crises em 40-50%
  • Bem estudados e eficazes

Antidepressivos:

  • Amitriptilina (mais eficaz)
  • Venlafaxina
  • Úteis especialmente quando há depressão ou ansiedade associadas

Anticonvulsivantes:

  • Topiramato
  • Valproato de sódio
  • Redução de 50% nas crises em muitos doentes

Anticorpos Monoclonais Anti-CGRP (Inovação Recente):

  • Erenumab, galcanezumab, fremanezumab
  • Injeção subcutânea mensal ou trimestral
  • Desenvolvidos especificamente para enxaqueca
  • Altamente eficazes com poucos efeitos secundários
  • Revolucionaram o tratamento preventivo

Toxina Botulínica (Botox):

  • Aprovada para enxaqueca crónica (≥15 dias/mês)
  • Injeções localizadas em pontos específicos da cabeça e pescoço
  • Tratamento a cada 12 semanas
  • Redução significativa de dias com cefaleia

Neuroterapia – A Revolução no Tratamento

A Neuroterapia representa uma das abordagens mais promissoras e inovadoras no tratamento de múltiplas condições neurológicas, incluindo a enxaqueca. A neuromodulação oferece uma alternativa eficaz com perfil de segurança superior aos tratamentos farmacológicos convencionais.

Estimulação Magnética Transcraniana (EMT)

A EMT é uma técnica não invasiva que utiliza campos magnéticos para modular a atividade cerebral em áreas específicas relacionadas com a enxaqueca.

Como Funciona: Pulsos magnéticos são direcionados ao córtex occipital ou pré-frontal, dependendo do protocolo. Estes pulsos modulam a hiperexcitabilidade cortical e interrompem a depressão alastrante cortical, explicada acima – atua nos mecanismos fundamentais da enxaqueca.

Protocolos de Tratamento:

  • EMT de pulso único (sTMS): Aprovada pela FDA para tratamento agudo e prevenção
  • Aplicação no início da aura ou da cefaleia
  • EMT repetitiva (EMTr): Sessões de 20-30 minutos, protocolo de 10-20 sessões

Análises de eficácia no tratamento da Enxaqueca:

  • Redução de 27-98% no número de dias com enxaqueca por mês
  • Diminuição significativa na necessidade de medicação aguda
  • Melhoria na classificação de intensidade de impacto da cefaleia (HIT-6)
  • Taxa de resposta de 50% na grande maioria dos estudos
  • Benefícios mantidos por meses após o tratamento

Vantagens da EMT:

  • Tratamento não invasivo e indolor
  • Sem efeitos secundários significativos
  • Efeitos secundários moderados muito reduzidos (< 3% dos pacientes)
  • Não cria dependência
  • Pode ser usada durante a gravidez em casos selecionados

Indicações Específicas:

  • Doentes que não responderam a 2 ou mais categorias de medicação preventiva
  • Intolerância aos efeitos secundários de medicação
  • Contraindicações a tratamentos farmacológicos
  • Preferência por tratamento não farmacológico
  • Enxaqueca durante a gravidez

Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (tDCS)

Técnica complementar que utiliza corrente elétrica de baixa intensidade para modular a excitabilidade cortical. Embora tenha menos evidência que a EMT para enxaqueca, mostra resultados promissores especialmente quando combinada com outras terapias.

Outras Terapias Não-Farmacológicas

Terapia Cognitivo-Comportamental

Ajuda a desenvolver estratégias de minimização de danos, redução do stress, e modificação de pensamentos disfuncionais relacionados com a dor. Particularmente útil quando há ansiedade antecipatória ou depressão associada.

Acupunctura

Evidência crescente sugere eficácia na redução da frequência de crises. Pode ser especialmente útil como complemento a outros tratamentos.

Na NeuroPsyque, oferecemos uma abordagem verdadeiramente integrada que combina Neurologia, Neuropsicologia e Neuroterapia avançada. O nosso objetivo é proporcionar a melhor expectativa de melhoria possível, utilizando as técnicas mais inovadoras disponíveis – incluindo Estimulação Magnética Transcraniana de última geração – com um perfil de segurança superior aos tratamentos convencionais.

Quando procurar ajuda profissional

Muitas pessoas vivem anos com enxaqueca sem procurar ajuda especializada, seja por desvalorização da condição, por receio ou por desconhecimento das opções terapêuticas disponíveis. É fundamental saber quando procurar avaliação médica.

Sinais que Justificam Consulta

Procure avaliação neurológica se verifica:

  • Cefaleias recorrentes que interferem com atividades diárias
  • Necessidade de medicação analgésica mais de 2-3 vezes por semana
  • Cefaleias que não respondem a tratamento convencional
  • Mudança no padrão habitual das suas cefaleias
  • Impacto significativo na qualidade de vida, trabalho ou relações

Quando é mesmo Urgente – sinais de alerta

Procure ajuda médica imediata se experienciar:

  • “Cefaleia em trovoada”: Dor que atinge intensidade máxima em segundos (pode indicar hemorragia cerebral)
  • Primeira enxaqueca após os 50 anos: Requer exclusão de outras causas
  • Cefaleia com febre, rigidez da nuca ou erupção cutânea: Pode indicar meningite
  • Cefaleia após traumatismo craniano
  • Sintomas neurológicos que persistem após a cefaleia: Fraqueza, alterações visuais, dificuldades de fala que não se resolvem
  • Confusão mental, alteração do estado de consciência ou convulsões
  • Cefaleia progressivamente pior ao longo de dias ou semanas
  • Cefaleia que desperta durante a noite

A Realidade em Portugal

Dados preocupantes mostram que:

  • 40% dos doentes não têm qualquer acompanhamento médico
  • 60% dos doentes em tratamento estão insatisfeitos
  • 55-70% desconhecem opções de tratamento inovadoras como anticorpos monoclonais ou Neuroterapia

Este cenário revela a necessidade urgente de maior sensibilização e acesso a cuidados especializados.

Nota Importante: A enxaqueca não tratada adequadamente pode cronificar, tornando-se progressivamente mais difícil de controlar. O diagnóstico precoce e tratamento especializado são fundamentais para prevenir esta progressão.

Como lidar com a Enxaqueca no dia-a-dia?

Para além do acompanhamento médico especializado, existem estratégias práticas que podem melhorar significativamente a qualidade de vida e reduzir a frequência e intensidade das crises.

Gestão de Triggers

Diário de Enxaqueca

Manter um diário detalhado durante pelo menos 2-3 meses é fundamental. Registe:

  • Data e hora do início
  • Sintomas premonitórios
  • Intensidade da dor (escala 0-10)
  • Duração total
  • Atividades nas 24h anteriores
  • Alimentos consumidos
  • Padrão de sono
  • Stress ou eventos emocionais
  • Fase do ciclo menstrual (mulheres)
  • Condições meteorológicas
  • Medicação tomada e resposta

Com o tempo, surgem padrões que permitem identificar triggers pessoais e antecipar crises.

Gestão do Stress:

  • Técnicas de respiração diafragmática
  • Pausas regulares durante o dia
  • Delegação de tarefas quando possível
  • Estabelecer limites saudáveis
  • Prática regular de atividades relaxantes

Técnicas de Relaxamento:

  • Relaxamento muscular progressivo
  • Respiração diafragmática
  • Meditação e mindfulness
  • Ioga adaptada

Exercício Físico Regular

Exercício aeróbico moderado (caminhada, natação, ciclismo) tem efeito preventivo comprovado. O importante é:

  • Regularidade (3-5 vezes por semana)
  • Intensidade moderada
  • Evitar exercício intenso súbito que pode desencadear crises
  • Boa hidratação

Higiene do Sono

O sono irregular é um dos triggers mais comuns:

  • Deitar e levantar à mesma hora todos os dias (incluindo fins de semana)
  • 7-9 horas de sono por noite
  • Quarto escuro, fresco e silencioso
  • Evitar ecrãs 1 hora antes de dormir
  • Rotina relaxante antes de deitar
  • Evitar sestas prolongadas durante o dia
Aqui encontra um artigo prático e detalhado sobre o sono, para ler depois.

Alimentação e Enxaqueca

Padrões Alimentares

  • Não saltar refeições (jejum é um trigger comum)
  • Manter horários regulares de refeições
  • Identificar alimentos problemáticos individuais
  • Moderar (não necessariamente eliminar) alimentos comumente associados
  • Hidratação adequada (1,5-2L água/dia)

Alimentos a Evitar ou Moderar

Embora os triggers alimentares sejam muito individuais, algumas orientações gerais ajudam:
  • Álcool (especialmente vinho tinto)
  • Queijos envelhecidos
  • Chocolate (para alguns)
  • Cafeína em excesso
  • Alimentos processados com conservantes
  • Adoçantes artificiais
  • Alimentos muito frios (gelados)

Privilegiar:

  • Refeições regulares e equilibradas
  • Frutas e vegetais frescos
  • Proteínas magras
  • Cereais integrais
  • Gorduras saudáveis (azeite, frutos secos)
  • Alimentos ricos em magnésio

Hidratação

A desidratação é um trigger muito comum. Beber água regularmente ao longo do dia é muito importante.

Estratégias Durante Crises

Quando uma crise se inicia:

  • Medicação precoce: Tomar medicação logo aos primeiros sinais faz a diferença
  • Ambiente adequado: Quarto escuro, silencioso, temperatura confortável
  • Repouso: Deitar-se se possível
  • Compressas frias: Na testa ou nuca podem aliviar a dor
  • Técnicas de respiração: Respiração lenta e profunda
  • Massagem suave: No pescoço e têmporas (se tolerado)
  • Hidratação: Pequenos goles de água

Apoio Social e Familiar

Comunicação: Explicar aos familiares, amigos e colegas o que é a enxaqueca e como afeta o seu estado. Educar sobre a diferença entre dor de cabeça e enxaqueca.

Estabelecer um plano: Informar pessoas mais próximas sobre sinais de crise e como podem ajudar (reduzir ruído, escurecer divisão, não exigir conversação).

Grupos de Apoio: Participar em grupos como a MiGRA Portugal permite partilhar experiências, estratégias e sentir-se compreendido. O conhecimento sobre a condição pode poupar muito tempo na forma de sofrimento.

Gerir Expectativas: Ser realista sobre limitações durante crises, sem culpa. Ter planos de contingência para compromissos importantes.

No Trabalho

  • Comunicar com supervisor/recursos humanos sobre a condição
  • Explorar flexibilidade de horários quando possível
  • Organizar espaço de trabalho se possível (iluminação, ruído)
  • Fazer pausas regulares
  • Ter medicação de emergência disponível
  • Conhecer locais tranquilos para descanso se necessário

Avanços na investigação científic

a

A investigação sobre enxaqueca está numa fase extraordinariamente dinâmica, com descobertas que estão a revolucionar a forma como compreendemos e tratamos esta condição.

A Descoberta do CGRP

A identificação deste peptídeo, relacionado com o gene da calcitonina (CGRP), como mediador fundamental da enxaqueca, representa um dos maiores avanços das últimas décadas.

Durante crises de enxaqueca, os níveis de CGRP estão marcadamente elevados. Esta substância:

  • Causa dilatação dos vasos sanguíneos cerebrais
  • Sensibiliza as vias da dor
  • Perpetua a inflamação neurogénica (inflamação do sistema nervoso)

Esta descoberta levou ao desenvolvimento de terapias direcionadas especificamente contra o CGRP.

Novos Medicamentos Revolucionários

Anticorpos Monoclonais Anti-CGRP

Representam a primeira classe de medicamentos desenvolvida especificamente para prevenir enxaquecas:

  • Erenumab: Bloqueia o recetor de CGRP
  • Galcanezumab: Bloqueia a molécula de CGRP
  • Fremanezumab: Bloqueia a molécula de CGRP
  • Eptinezumab: Bloqueia a molécula de CGRP

Características:

  • Injeção subcutânea mensal ou trimestral (exceto o eptinezumab, administrado por via intravenosa)
  • Redução de 50% ou mais nos dias de enxaqueca em 40-60% dos doentes
  • Bom perfil de segurança
  • Menos efeitos secundários que outros fármacos (algumas reações no local da injeção)
  • Não interagem com outros medicamentos

Gepantes (Pequenas Moléculas Orais)

Nova classe de medicamentos que bloqueiam o recetor de CGRP:

  • Rimegepant, Ubrogepant
  • Via oral (comprimidos)
  • Podem ser usados tanto para tratamento agudo como preventivo
  • Alternativa aos triptanos (mencionados acima)
  • Podem ser usados em doentes com doença cardiovascular

Biomarcadores

Investigadores estão neste momento a desenvolver biomarcadores que permitirão:

  • Diagnóstico mais objetivo
  • Previsão/estimativa aproximada de resposta a tratamentos específicos
  • Identificação de subtipos de enxaqueca
  • Abordagem baseada no perfil individual (mais personalização no tratamento)

Terapias Emergentes

Estimulação do Nervo Vago: Dispositivos não invasivos que estimulam o nervo vago através da pele do pescoço. Estudos mostram eficácia tanto no tratamento agudo como preventivo.

Dispositivos Neuromoduladores Portáteis – Diversos dispositivos aprovados para uso domiciliário:

  • Estimulação magnética transcraniana portátil (sTMS)
  • Estimulação eléctrica externa do trigémeo
  • Estimulação transcutânea do nervo vago

Compreensão dos Mecanismos da Enxaqueca

Microbioma Intestinal: Estudos emergentes sugerem uma ligação entre o microbioma intestinal e a enxaqueca, abrindo caminho para intervenções probióticas.

Neuroimagem Avançada: Técnicas sofisticadas de ressonância magnética funcional revelam alterações cerebrais específicas em pessoas com enxaqueca, mesmo entre crises.

Perspetivas Futuras

Nos próximos 5-10 anos, podemos esperar:

  • Mais medicamentos direcionados ao CGRP e outras vias específicas
  • Dispositivos neuromoduladores mais eficazes e acessíveis
  • Protocolos de tratamento altamente personalizados
  • Terapias que podem modificar o curso da doença, não apenas tratar sintomas
  • Melhor compreensão dos mecanismos que permitirá prevenção em pessoas de alto risco, antes dos primeiros sintomas

A investigação oferece esperança real de que, num futuro não muito distante, a enxaqueca possa ser uma condição muito melhor controlada, ou mesmo prevenida.

Mitos e Verdades sobre a Enxaqueca

O estigma e os mitos em torno da enxaqueca contribuem para o subdiagnóstico e o sofrimento silencioso de milhões. É fundamental desmistificar conceções erradas.

MitoVerdade
“É só uma dor de cabeça forte”A enxaqueca é uma doença neurológica complexa que envolve alterações cerebrais específicas, com componente genética forte. É reconhecida pela OMS como a 2ª maior causa de incapacidade globalmente.
“Afeta só mulheres”Embora seja 2-3 vezes mais comum em mulheres, 1 em cada 10 homens também sofre de enxaqueca. A diferença de género está relacionada com hormonas.
“Não tem tratamento”Existem múltiplas opções terapêuticas eficazes: medicação aguda e preventiva, Neuroterapia, anticorpos monoclonais, dispositivos neuromoduladores e outras terapias não-farmacológicas.
“É tudo psicológico ou stress”Embora o stress possa ser um trigger, a enxaqueca é uma condição neurológica com alterações físicas mensuráveis no cérebro. Não é “imaginação”.
“Quem tem enxaqueca tem sempre dor de cabeça”Toda a enxaqueca é episódica – há crises seguidas de períodos sem sintomas. Mesmo na enxaqueca crónica, presente na maior parte dos dias do mês, há dias em que os sintomas não estão presentes.
“Não se pode fazer nada durante uma crise”Com tratamento adequado e estratégias de gestão, muitas pessoas conseguem manter a funcionalidade, embora reduzida.

Recursos e apoio disponíveis em Portugal

Portugal dispõe de diversos recursos para pessoas com enxaqueca, embora o acesso ainda apresente desafios significativos.

RecursoDescriçãoContacto
MiGRA Portugal – Associação Portuguesa de Doentes com Enxaquecas e CefaleiasAssociação de doentes que oferece informação, apoio, sensibilização e defesa de direitos. Grupos de apoio e partilha de experiências.www.migraportugal.pt
Serviço Nacional de Saúde (SNS)Consultas de neurologia através do médico de família. Acesso a tratamentos comparticipados.Centro de Saúde local
Linha SNS 24Apoio telefónico 24 horas para questões de saúde e orientação808 24 24 24
Hospitais UniversitáriosConsultas especializadas em cefaleias e dor. Unidades de cefaleia em hospitais centraisVários (Lisboa, Porto, Coimbra…)

Acesso a Tratamentos

Desafios do SNS:

  • 70% dos doentes acompanhados tiveram de recorrer ao setor privado
  • Listas de espera demasiado longas para consultas de neurologia
  • Anticorpos monoclonais ainda com acesso limitado
  • Tratamentos inovadores não constam ou são escassos

Conclusão

A enxaqueca é uma doença incapacitante com grande impacto em todos os aspetos da vida. Longe de ser “apenas uma dor de cabeça”, é uma condição complexa com base genética e neurobiológica que transforma profundamente a vida de quem dela sofre.

Pontos-chave essenciais:

As alterações cerebrais na enxaqueca são mensuráveis e a base genética é comprovada. O estigma de que “é só uma dor de cabeça” contribui para o sofrimento silencioso e o subdiagnóstico.

O diagnóstico correto e atempado é fundamental. Muitos doentes vivem anos sem saber que têm enxaqueca, tomando medidas inadequadas e sofrendo em demasia. Um acompanhamento especializado faz toda a diferença.

Existem tratamentos altamente eficazes disponíveis para a condição. Desde medicação específica como triptanos e anticorpos monoclonais anti-CGRP, até terapias inovadoras como a Neuroterapia, as opções terapêuticas expandiram-se dramaticamente nos últimos anos.

A Neuroterapia, especialmente a Estimulação Magnética Transcraniana, representa uma revolução no tratamento. Com evidência científica sólida, demonstra uma taxa média de redução (de pelo menos metade do número de episódios) de 45%, e oferece uma alternativa segura e eficaz com perfil de segurança largamente superior aos tratamentos farmacológicos convencionais.

A gestão da enxaqueca vai além da medicação. Identificação de triggers, modificações no estilo de vida, higiene do sono, gestão de stress e apoio psicológico são componentes essenciais de uma abordagem integrada.

Em Portugal, enfrentamos alguns desafios particulares: 40% dos doentes não têm acompanhamento médico regular, 60% estão insatisfeitos com o tratamento, e a maioria desconhece opções inovadoras. É fundamental aumentar a sensibilização, melhorar o acesso a cuidados especializados e combater o estigma.

Mensagem de esperança:

A enxaqueca não é uma sentença definitiva. Com diagnóstico correto, tratamento adequado e acompanhamento especializado, é possível recuperar qualidade de vida, reduzir significativamente as crises e voltar a planear o futuro sem medo constante.

Cada pessoa é única, e encontrar a combinação terapêutica ideal pode requerer tempo e ajustes, mas vale a pena persistir. Os avanços científicos recentes trouxeram mais opções do que nunca, e o futuro é promissor.

Na NeuroPsyque, dispomos dos mais especializados equipamentos e especialistas em terapêuticas como a Estimulação Magnética Transcraniana e a Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua, que se têm revelado fundamentais no tratamento da enxaqueca.

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FAQ’s sobre Enxaqueca

1. A enxaqueca tem cura?

A enxaqueca não tem uma cura definitiva, no sentido da eliminação completa e permanente dos sintomas. Ainda assim, pode ser muito bem controlada com tratamento adequado. Com as terapias disponíveis atualmente – incluindo medicação preventiva, Neuroterapia e gestão de triggers – muitos doentes experienciam redução drástica na frequência e intensidade das crises, permitindo uma vida normal e produtiva.

2. Qual a diferença entre enxaqueca e dor de cabeça?

Enxaqueca é um tipo específico de cefaleia (dor de cabeça). Ao contrário de outras dores de cabeça, que são sintomas de outras doenças, a enxaqueca é uma doença neurológica em si. Caracteriza-se por uma dor pulsátil moderada a grave, frequentemente unilateral, com duração de 4-72 horas, acompanhada de náuseas, fotofobia e fonofobia. Uma dor de cabeça comum (cefaleia tensional) é geralmente bilateral, tipo pressão ou aperto, ligeira a moderada, sem os sintomas associados característicos da enxaqueca.

3. Como é feito o diagnóstico de enxaqueca?

O diagnóstico é clínico, baseado na história detalhada dos sintomas e exame neurológico. Não existe um exame específico que “confirme” a enxaqueca. O médico avalia características da dor, sintomas associados, frequência, histórico familiar e impacto funcional. Exames complementares (ressonância, TAC) são necessários apenas quando há sinais de alerta que sugerem outras causas.

4. O que é a aura da enxaqueca?

A aura consiste em sintomas neurológicos temporários e completamente reversíveis que precedem a cefaleia em 10-60 minutos. A aura visual é a mais comum (90% do total de sintomas de aura), com pontos brilhantes, linhas em ziguezague ou manchas no campo visual. Também pode incluir formigueiros, dormência, dificuldades de fala ou, raramente, fraqueza temporária. Apenas 20-30% das pessoas com enxaqueca têm aura.

5. Quais os principais triggers da enxaqueca?

Os triggers são muito individuais, mas os mais comuns incluem: alterações hormonais (menstruação), stress ou relaxamento após stress, alterações no padrão de sono (excesso ou privação), jejum prolongado, certos alimentos (chocolate, queijos, álcool), mudanças climáticas, luzes intensas, ruídos, odores fortes e exercício físico intenso súbito. Raramente um único fator isolado causa crise – geralmente é a combinação de vários.

6. A Neuroterapia é eficaz para enxaqueca?

Sim, muito eficaz. A Estimulação Magnética Transcraniana tem evidência científica robusta demonstrando uma redução muito significativa no número de dias com enxaqueca por mês. Estudos multicêntricos mostram que 40-60% dos doentes têm redução de 50% ou mais nas crises. A grande vantagem é o perfil de segurança superior – tratamento não invasivo, indolor, sem efeitos secundários significativos e sem risco de dependência. Aprovada pela FDA (EUA) e com marcação CE (Conformidade Europeia).

7. Quanto tempo demora o tratamento da enxaqueca?

Depende da abordagem. Medicação aguda deve ser tomada logo ao início da crise. Tratamentos preventivos farmacológicos demoram 6-12 semanas para mostrar efeito completo. A Neuroterapia geralmente envolve protocolos de 10-20 sessões, com benefícios que podem começar a surgir após 5-10 sessões e manter-se por meses. O tratamento é contínuo e ajustado conforme a resposta.

8. A enxaqueca é hereditária?

Sim, tem forte componente hereditária. 70% das pessoas com enxaqueca têm um familiar próximo com a condição. Se ambos os pais têm enxaqueca, o risco para os filhos é cerca de 70%. Se apenas um progenitor tem, o risco é 45%. Múltiplas variantes genéticas estão associadas à enxaqueca, confirmando a sua base biológica.

9. Porque é que a enxaqueca afeta mais as mulheres?

As mulheres têm um risco 2-3 vezes superior devido às hormonas sexuais femininas, especialmente estrogénios. Antes da puberdade, a prevalência é igual entre rapazes e raparigas. Após a primeira menstruação, a diferença aumenta dramaticamente. Muitas mulheres têm enxaqueca menstrual relacionada com a queda de estrogénios. A gravidez pode melhorar temporariamente, e a menopausa frequentemente atenua as crises.

10. O que fazer durante uma crise de enxaqueca?

Tome medicação específica logo aos primeiros sinais (é mais eficaz precocemente). Deite-se num quarto escuro, silencioso e fresco. Aplique compressas frias na testa ou nuca. Pratique respiração lenta e profunda. Evite estimulação sensorial (luz, ruído, odores). Mantenha-se hidratado com pequenos goles de água. Descanse sem culpa – o corpo precisa.

11. Quando é a enxaqueca considerada crónica?

A enxaqueca crónica é diagnosticada quando há cefaleia em 15 ou mais dias por mês durante pelo menos 3 meses, sendo que em pelo menos 8 desses dias a cefaleia tem características de enxaqueca. Requer abordagem preventiva especializada, podendo beneficiar de toxina botulínica ou anticorpos monoclonais.

12. Existem grupos de apoio em Portugal?

Sim, a MiGRA Portugal (Associação Portuguesa de Doentes com Enxaquecas e Cefaleias) é a principal organização de apoio a doentes com enxaqueca, oferecendo grupos de apoio presenciais e online, webinars educativos, informação atualizada sobre tratamentos e defesa de direitos dos doentes. O contacto e partilha com outros que vivem a mesma realidade é fundamental para não se sentir sozinho e para aprender estratégias práticas de gestão.

13. O café ajuda ou piora a enxaqueca?

Depende. A cafeína tem efeito paradoxal: em doses moderadas durante uma crise pode ajudar (por isso está presente em alguns medicamentos para enxaqueca), mas o consumo excessivo habitual ou a privação súbita são triggers potentes. Se consome café regularmente, mantenha a quantidade consistente. Evite mais de 2-3 cafés por dia e não pare abruptamente nos fins de semana.

14. As crianças podem ter enxaqueca?

Sim. A enxaqueca pode surgir na infância, embora as manifestações sejam diferentes: crises frequentemente bilaterais, mais curtas (podem durar menos de 4 horas), vómitos mais proeminentes, e pode manifestar-se como vómitos cíclicos ou vertigem recorrente. A identificação precoce é fundamental para tratamento adequado e prevenção do impacto no desenvolvimento e rendimento escolar.

15. Como explicar a enxaqueca aos outros?

Seja direto e educativo: “Enxaqueca não é uma simples dor de cabeça. É uma doença neurológica reconhecida pela OMS como a 2ª maior causa de incapacidade a nível global. Durante uma crise, tenho uma dor pulsante grave, náuseas, e hipersensibilidade extrema à luz e som que me impede completamente de funcionar. Não é algo que passe com uma aspirina. É sempre uma incerteza dizer se vou estar disponível numa data mais à frente. Preciso de compreensão quando tenho de cancelar planos ou necessito de ficar num quarto escuro.” Partilhe recursos educativos como este artigo – certamente ajudará!

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